Quando a fotografia surgiu, no século 19, uma grande parcela da população viu na nova tecnologia uma oportunidade para que as famílias pudessem ter seus retratos, o que, na pintura, só a nobreza e as elites política e econômica tinham condições de fazer. A fotografia democratizou o retrato, mas os fotógrafos de então procuravam reproduzir, nas imagens feitas em estúdio, algo muito próximo da estética do trabalho pintado a óleo.
No Brasil, uma família muito importante e de posses tinha, no entanto, uma outra relação com a fotografia. Para eles, a nova técnica não era, obviamente, uma maneira mais econômica de serem retratados, e sim uma forma de documentação e memória social cuja importância eles reconheciam.
Parte do acervo de fotos que revelam a intimidade da família imperial brasileira está em exibição no Instituto Moreira Salles (IMS), no Rio de Janeiro. A mostra Retratos do Império e do Exílio, aberta ao público, com entrada franca, na quarta-feira passada (23), apresenta 150 fotografias pertencentes à coleção do príncipe dom João de Orleans e Bragança, também curador da exposição, juntamente com Sergio Burgi, coordenador de fotografia do IMS.
Em grande parte inédito para o público, o que está sendo mostrado agora é apenas parte de um conjunto de 781 imagens depositado no IMS, em regime de comodato, pelo príncipe, herdeiro da coleção. Focada na temática do retrato, nas imagens diretamente associadas aos membros da família imperial, a mostra também reúne fotografias que registram episódios históricos de importância fundamental no período, como a Guerra do Paraguai e a Abolição da Escravatura.
A predominância, no entanto, é do retrato. “São imagens que, apesar do contexto ainda formal daquele período já revelam uma relação muito mais direta, franca e afetiva, que a gente percebe nos gestos, nos olhares, e que diz bastante sobre aspectos da personalidade dos membros da família imperial”, diz o curador Sergio Burgi.
Segundo ele, essa forma de olhar está bem presente nas fotografias feitas Revert Henry Klumb, professor de fotografia das princesas Isabel e Leopoldina, e Marc Ferrez, o grande nome da fotografia no século 19, agraciado pelo imperador com o título de Cavaleiro da Ordem da Rosa. Fotógrafo de paisagens e das ferrovias na época em construção no país, Ferrez documentou os filhos da princesa Isabel e outros membros da família em momentos de intimidade.
“São momentos difíceis de serem encontrados na fotografia daquele período”, afirma Burgi. É o caso de um retrato da imperatriz Teresa Cristina, de 1861, posando para o fotógrafo Klumb, com as princesas Isabel e Leopoldina aparecendo ao fundo, numa brincadeira. “Isso era inusitado para o período, quando a fotografia como retrato ainda era muito formal, com poses em estúdio”, diz o curador.
Sempre em sintonia com as novidades tecnológicas de sua época, dom Pedro II foi um pioneiro da fotografia no Brasil. Comprou equipamentos, foi entusiasta, mecenas, colecionador e praticante, ainda que amador, da fotografia. “O acervo agora em comodato com o IMS é o familiar, mas dom Pedro doou uma coleção de mais de 25 mil itens à Biblioteca Nacional”, lembra Sergio Burgi.
O legado do imperador foi transmitido a seu trineto, o príncipe dom João, fotógrafo profissional. Na abertura da mostra, para convidados, no último dia 22, uma mesa-redonda, com a participação do príncipe e a mediação de Sergio Burgi, discutiu a contribuição do imperador para a fotografia brasileira no século 19. “Em seu trabalho como profissional, dom João demonstra, a exemplo de seu trisavô, um interesse muito sincero pelas questões do país, retratando e documentando em suas fotos a realidade brasileira, evidentemente sob uma linguagem contemporânea”, afirma o coordenador de fotografia do IMS.
De acordo com Sergio Burgi, a exposição, que fica em cartaz até 29 de maio, é a primeira de uma série que o Instituto Moreira Salles pretende realizar a partir do acervo. Centro cultural que tem na arte fotográfica uma de suas principais áreas de atuação, o IMS reuniu ao longo dos anos um conjunto muito expressivo da fotografia brasileira dos séculos 19 e 20, que inclui o acervo completo de negativos de importantes nomes da arte, como Marcel Gautherot e José Medeiros. “As fotografias são digitalizadas e disponibilizadas para pesquisas e projetos editoriais, não apenas do próprio instituto”, explica Burgi.
Após a temporada carioca, a mostra deve seguir para São Paulo e Poços de Caldas (MG), onde o IMS também tem espaços culturais, e para outras cidades do país. No Rio, a exposição pode ser vista de terça a sexta-feira, das 13h às 20h, e sábados, domingos e feriados, das 11h às 20h. O Instituto Moreira Salles fica na Rua Marquês de São Vicente, 476, na Gávea, zona sul do Rio.
Da Agência Brasil, via Pernambuco.com
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